27 de abril de 2009

Oberon e o novo mundo, ou...

Sonhos de Ophelia e Hamlet em uma tarde de inverno



"E a sorte está lançada senhores! Abrem-se as cortinas de mais um palco. Dá-se início a mais um novo mundo!

Vamo-nos, amigos!

Sigamos para onde não nos estendem braços seguros e não há sinal de palavras modeladas pelo cinzel do mordaz farsante; haveremos de pescar em terras do além, onde o soturno é belo e a hipocrisia não amaina a lâmina cortante da língua afiada dos peixeiros à beira da calçada; filósofos errantes, girantes em rodas-vivas estacionárias, cheirando a vinho tinto barato; cabelos, pernas, bocas, apelos, ladainhas de santos vivos, mortos, a um passo do precipício.

Avante, amigos! Haveremos de vagar por entre os céticos e crentes e perenes e atrozes, sendo a pedra e a água, a meretriz e a mulher insone que vaga no vestíbulo das purificações d'alma, o caçador e a eterna caça, o verdugo e o pacificador, a etérea plaga dos arrebatadores de corpos, as pastagens e as torrentes áridas dos desertos de onde voltamos e jamais pisamos.

Eis que entoaremos nosso canto de glória à hora em que dorme a mortal humanidade, unindo-nos aos loucos, recitando visões de tempos antes da lua ao observar, de nosso amplo mirante além-mar, o revoar de pássaros de uma outra aurora, admirando do topo de nossa pena lírica os cataclismos de um velho clã social.

Haveremos de contemplar os caminhos desenhados pelo licor dos lábios entreabertos, das feridas na pele nua de nossos pés ao toque pérfuro-lacerante dos espinhos; e permaneceremos suspensos em pensamentos, vislumbrando a total evisceração de emoções desumanas, humanas, dos homens e mulheres deste tempo.

Haveremos de erguer o olhar a um céu impermanente, sem que nos caiam o cálice e a espada das mãos à terra abismática das ilusões e, como luas e sóis inditosos, espelharemos as nossas entranhas nas águas calmas, turbulentas do oceano das revelações.

A inexorabilidade da seta arremassada contra o inimigo, o doido seteiro rondando a muralha; o feixe de luz inundando a casa através da seteira; a seta e o alvo; o côncavo e convexo da claridão; o sol escalando as dunas bolorentas da folha cinza em branco do pensamento; as peças de xadrez movendo-se de um canto a outro do tabuleiro no vazio escuro da sala; o canto solitário das cordas vocais do violino; as mãos de um violinista preservadas no cofre atrás do quadro; a novocaína dissecando as veias do velho estoico; a adrenalina como fumo ardoso no baixo ventre do hedonista; a consagração de uma ditadura niilista; negar-se cara a cara no reflexo das águas perante o túmulo de Narciso, ver-se Narciso, indeciso, iso; levitar sobre a divisa entre o sul e o norte na linha do equador no último dia de solstício; psicodélicos girassóis de maio à margem da estrada; um vôo alçado das costas de Gibraltar no imenso azul do mar.

Secar o mar com a nossa sede de amar...vazar mar das artérias em febre, iodar, salgar, mar-amar, ah!

(...)

*Observação no cantinho da página: sem linha. Escrever nas cem linhas do tempo. Lembrar de colocar o cachorro-quente na sala, o gato no forno, deixar extraterrestre de plantão."








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