8 de abril de 2014

Zugzwang




Com a chuva ora correndo, louca, em seu encalço, ora debulhando-se em lágrimas sobre sua face, e o frio triturando-lhe os ossos sob a pele encharcada, ela saiu, insone, de sua torre, rumo ao escuro da noite. Tendo a mão a fraca luz de uma lanterna e ao chão os pés descalços, caminhou pelo corredor de sombras abissais projetadas por algo de si sem nome que rasteja, revira-se e some. 

No templo de uma clareira, palco alumbrado pelo sobrenatural, ela ergueu os olhos para o breu do espaço e divisou estrelas na tela apagada atemporal. Ergueu-se de sua miséria, afastou-se de toda dor, e, no vazio preenchido por Delírio, mostrou-se bela. De olhos fechados, abriu-se para o Insondável, pronunciando a sentença no tribunal da consciência: 

"Culpada."

Sorriu um sorriso torto. Gritou uma prece silente. Cortejou os deuses, provocou os anjos. Erguendo os braços, em queda livre, aguardou. 

Mas o raio rasgante jamais chegou.




Nenhum comentário:

Postar um comentário