"Você confia nessa pessoa para creditá-la tamanha confiança?", certa vez perguntei ao amigo.
"Não cegamente, eu seria tolo se assim o fizesse", respondeu.
"Porém o suficiente", insisti.
"Creio que sim", deu de ombros, "Temos afinidades ideológicas e políticas, ela tem estado próxima, é do meu círculo".
"Círculos são quebrados o tempo todo, círculos podem sem viciosos", eu disse.
Ele pareceu considerar. "E se fosse você, o que faria?", questionou.
"Evitaria situações assim. Contudo, se fossem impossíveis de afastar, eu seria como o rei desconfiado que mantém sob vigilância os mais próximos de si".
Ele piscou, espantado, e sacudiu levemente a cabeça, sorrindo. "Por que ainda me admiro vindo de você?"
Deslizei no banco, esticando as pernas, e cruzei os braços. "Pense bem, é como o ponto cego de uma câmera", indiquei, com uma inclinação de cabeça, o equipamento no alto, acima de nós, com seu olho mecânico apontando para a praça. "O mais seguro é manter-se fora do seu raio de alcance, e que melhor lugar que o ponto cego? Estar perto da câmera o suficiente, sob ela, é a 'cobertura circunstancial' perfeita, o esconderijo e a camuflagem. O mesmo ocorre com os mais próximos, aqueles que chama de "amigos" pela conveniência da situação, esses a quem delega tarefas e poderes para falar e agir em seu nome".
Ele cruza os braços sobre a mesa de pedra. Ao lado, um cachorro sem dono fareja alimento. O incômodo revira em meu peito. "No meu lugar, o que faria?", ele acena. "O que sugere?"
"Eu não estaria no seu lugar. Por outro lado, não me custa sugerir e minha recomendação é redefinir aquele famoso ditado para algo mais apropriado".
"E que seria...?"
"Mantenha os inimigos perto (o suficiente do seu raio de visão)... e os amigos mais ainda".
"Você as vezes me dá medo", ele riu.
"É culpa de Sekhmet. Quando resolve transitar pelos corredores de Anúbis".
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