18 de setembro de 2012

Todos iguais, tão desiguais. Uns mais iguais e desiguais que outros






Pergunta que não cala a cada dois anos: 

A soma de mais da metade dos votos nulos torna inválida uma eleição, sendo necessário a convocação de uma nova? 

Resposta seca e brutal:

Obviamente que não. 

Estamos no Brasil, pessoas, no Estado Democrático de Direito. Esse que procura, a torto, 'à direita e à esquerda', não deixar pontas soltas e brechas em seus estatutos legais, especialmente quando o assunto é voto, esse meio legítimo e democraticamente obrigatório de garantir a perpetuidade de parte do Sistema Capital através da "vontade do povo" - o júri popular de si mesmo, a quem o Sistema entrega a corda com a qual se fará o laço para a forca ou para o embrulho do presente, que, nos finalmente, pode se revelar uma baita de uma caixa-bomba. 

Inicialmente, é bom lembrar, a regra contida no art. 224 do Código Eleitoral ("Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias") não se confunde com a regra prescrita no art. 175, § 4º, que trata especificamente do pleito proporcional ("Serão nulas as cédulas: I - que não corresponderem ao modelo oficial; II - que não estiverem devidamente autenticadas;III - que contiverem expressões, frases ou sinais que possam identificar o voto. [...] § 4º O disposto no parágrafo anterior não se aplica quando a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro for proferida após a realização da eleição a que concorreu o candidato alcançado pela sentença, caso em que os votos serão contados para o partido pelo qual tiver sido feito o seu registro).

Importante não se perder de vista o que a Justiça Eleitoral entende como NULIDADE - é aqui onde muitos se perdem, por confundir o voto nulo com a nulidade da votação segundo a lei. Isso porque "passam batido" pelos arts. 220, 221 e 222 do Código Eleitoral, que são taxativos, elencando, um a um, os fatos jurídicos que tornam uma votação nula de pleno direito (art. 220) e os que a tornam passível de anulação (arts. 221 e 222) *

Isto é, a nulidade de que trata o art. 224, do Código Eleitoral, é aplicada UNICAMENTE aos votos tidos como válidos. Votos nulos e votos brancos não são considerados válidos, portanto, não computáveis para efeito de nulidade. Dos votos considerados válidos, calcula-se, então, aqueles que estiverem eivados de vícios. Vícios esses que, segundo o próprio Código (no art. 222), ensejam a anulação, sendo eles, precisamente: "falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o Art. 237 ("interferência do poder econômico e desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto"), ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei".

Se a somatória dos votos válidos viciados ultrapassar mais da metade (50% dos votos + 1), aí, sim, tem-se nova eleição no prazo legal estabelecido. 

Onde chegamos a seguinte questão:

Por que não entender e transformar o voto nulo em "voto de rejeição"? Rejeitar, de 'negar-se a aceitar as opções apresentadas como únicas ou melhores'; rejeitar [Do lat. rejectare.] enquanto verbo transitivo direto, significando 1.Lançar fora; largar, depor. 2.Lançar de si; tirar de si; repelir. 3.Lançar de si; expelir; vomitar, regurgitar. 4.Não admitir; recusar. 5.Não aprovar; reprovar, desaprovar. Não aceitar; recusar. Ter em pouca ou nenhuma conta; desprezar, desdenhar. 8.Defender-se de; repelir. 9.Opor-se ou negar-se a. 10.Atirar, arremessar, lançar, arrojar. Ou enquanto verbo transitivo direto e circunstancial, significando, curta e diretamente 11.Rejeitar. 12.Repelir, afastar, apartar. 

Ideólogos e doutrinadores e, claro, os pró-nulidade compreendem o Voto Nulo como Voto de Rejeição já da época em que as eleições não eram eletrônicas mas efetuadas através de cédulas, nas quais os eleitores indignados e cansados de "mais do mesmo" escreviam "declarações de amor violento" ao Sistema ou aos candidatos, com xingamentos e textículos irônicos (do tipo "Quem quiser subir, enfie pólvora no rabo e acenda o pavio", ha!) como forma "terapêutica" de expressar sua total desaprovação e descontentamento. 


Lembrando que hoje, mesmo não havendo o botão "VOTO DE REJEIÇÃO" ou "VOTO NULO" na Urna Eletrônica - sonho de muitos -, as urnas computam, para efeito de cálculo, os votos "inválidos" - com a benesse de não ter que ler palavreados e discursos inflamados, como antigamente. Ou, quem sabe, o passado terá um encontro psicodélico com o futuro, e tenhamos eleições via Twitter e Facebook, com espaço para comentários de todos os versos, tons e matizes, e botões de "curtir consciente", "rejeitar consciente", "eu kiko?", e "morre, diabo!"... não?

A pergunta ironicus da vez é: o que aconteceria se 80% ou 90% dos eleitores resolvessem encenar "Ensaio sobre a Lucidez", de Saramago, recusando-se a aceitar os candidatos, e votassem nulos? Embora não havendo vícios que anulassem a eleição, embora inexistindo fatos que a tornassem nula de pleno direito, ainda assim, uma minoria decidiria pelo que a maioria esmagadora optou por rejeitar? 

Saramaguismos à parte, o único ensaio que passista nenhum gostaria de fazer é aquele sobre a cegueira. Votar lúcido continua sendo a (única) inteligente opção que se tem a mão. E o melhor de tudo? O fundo musical, sem dúvida.




 

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* Art. 220. É nula a votação:

I - quando feita perante mesa não nomeada pelo juiz eleitoral, ou constituída com ofensa à letra da lei;

II - quando efetuada em folhas de votação falsas;

III - quando realizada em dia, hora, ou local diferentes do designado ou encerrada antes das 17 horas;

IV - quando preterida formalidade essencial do sigilo dos sufrágios.

V - quando a seção eleitoral tiver sido localizada com infração do disposto nos §§ 4º e 5º do art. 135. 

Parágrafo único. A nulidade será pronunciada quando o órgão apurador conhecer do ato ou dos seus efeitos e o encontrar provada, não lhe sendo lícito supri-la, ainda que haja consenso das partes.
Art. 221. É anulável a votação: 

I - quando houver extravio de documento reputado essencial;  

II - quando fôr negado ou sofrer restrição o direito de fiscalizar, e o fato constar da ata ou de protesto interposto, por escrito, no momento: 

III - quando votar, sem as cautelas do Art. 147, § 2º. 

a) eleitor excluído por sentença não cumprida por ocasião da remessa das folhas individuais de votação à mesa, desde que haja oportuna reclamação de partido;

b) eleitor de outra seção, salvo a hipótese do Art. 145;

c) alguém com falsa identidade em lugar do eleitor chamado.

Art. 222. É também anulável a votação, quando viciada de falsidade, fraude, coação, uso de meios de que trata o Art. 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei.



2 comentários:

  1. Esse texto precisa ser lido pelo máximo de pessoas possível, Inna, sua linda. ;)

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  2. Pois divulguemos! Com segundo turno, sem segundo turno, em época eleitoral, sem época... todo dia é dia de cidadania, Amanda-Rock, sua diva! ;D

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